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Reportagem

Recife cria núcleo de prevenção e combate à violência escolar

Marcelo Robalinho

Ampliar os instrumentos de manutenção do bem-estar dentro das escolas municipais recifenses, prevenindo a violência e o uso de drogas, combater os diversos tipos de discriminação e promover o protagonismo juvenil e a cultura de paz. Essas ações fazem parte do trabalho desenvolvido pelo Núcleo de Enfrentamento à Violência Escolar (Neve). Criado em 2016 pela Secretaria de Educação do Recife através da Portaria nº 1.335/2016, o núcleo atende toda a rede municipal de ensino, tendo como foco maior de atuação as 36 escolas de anos finais do Ensino Fundamental da capital, que vão do 6º ao 9º ano (Fundamental II).

Dessas, sete escolas são de tempo integral, onde o aluno permanece o dia inteiro cursando uma grade curricular diferenciada. Nos colégios em que o Neve atua, são realizadas palestras e atividades de formação para gestores, professores e alunos, algumas delas com a participação de parceiros, como o Tribunal de Justiça, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) e o Instituto Brasileiro de Direito da Informática (IBDI), com o intuito de discutir assuntos ligados à violência.

A partir do trabalho do Núcleo, já foram produzidos materiais educativos. Um deles foi a “Cartilha de Líderes Estudantis”, lançada durante a posse dos representantes dos alunos nas escolas em julho de 2016. A finalidade foi orientar os estudantes na importância da escolha dos seus líderes, contribuindo com o exercício da cidadania ativa dentro do ambiente escolar. Em 2017, o Neve produziu o folder “Você sabe o que é bullying?”, explicando em que consiste esse tipo de intimidação, humilhação e discriminação sistemática, incluindo violência física ou psicológica.

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Cartilha de Líderes Estudantis orienta jovens sobre importância na escolha dos seus representantes | FOTO: Daniel Tavares/PCR.

Eleições para líder de turma na Escola Municipal Manoel Torres, em Boa Viagem, no Recife | FOTO: Daniel Tavares/PCR.

Ambos os materiais estão disponíveis para download no Portal da Educação da Prefeitura do Recife. “As ações do Neve se inserem dentro da pauta das políticas afirmativas com a função de colaborar com a formulação, a implementação e a avaliação de políticas públicas voltadas à questão da violência e ao uso de drogas. A perspectiva é de cuidado com o estudante e combate à violência escolar”, explica Denise Albuquerque, atual coordenadora do Neve.

 

Pesquisa sobre violência

O projeto de criação do Núcleo começou a ser construído na Prefeitura do Recife, em 2015, porém só em 2016 foi elaborada uma portaria para embasar a sua implementação oficial. No âmbito federal, a Lei nº 13.185/2015 – que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) – reforçou legalmente a criação do Neve. Antes mesmo da sua institucionalização, o grupo que constituiu o Neve juntamente com a Gerência de Educação Integral e Anos Finais da Secretaria de Educação aplicou um questionário em 36 escolas das seis regiões político-administrativas do Recife (RPAs) entre os meses de fevereiro e setembro de 2016. Nelas, 144 pessoas, entre gestores, professores e estudantes, responderam a 17 questões. A intenção era conhecer um pouco mais da realidade escolar relacionada à violência.

De acordo com os resultados, os estudantes apareceram como os principais agressores em incidentes violentos na escola (63,44%), seguidos dos pais (14,7%) e dos professores (9,89%). Nessas ocorrências, os próprios alunos também são as principais vítimas (25,8%). Em segundo lugar, aparecem o gestor e o professor (18,58%) e depois o coordenador (16,93%). Ameaças de estudante contra outro estudante (24,51%), ofensas pessoais e/ou atos de humilhação (21,66%), agressões físicas entre estudantes (19,38%) e vandalismo e depredação contra o patrimônio público (11,40%) foram apontados como os tipos de incidentes mais frequentes.

Resultados da pesquisa realizada em 2016 sobre a violência no ambiente escolar | FONTE: Acervo Neve.

Resultados da pesquisa realizada em 2016 sobre a violência no ambiente escolar | FONTE: Acervo Neve.

Ainda segundo a pesquisa, o pátio apareceu como o local onde mais ocorrem incidentes violentos dentro do colégio, especialmente durante o recreio e os intervalos das aulas. “Com esse resultado, decidimos desenvolver, em 2017, uma formação junto aos funcionários que trabalham como apoios de pátio nas escolas de tempo integral a partir da proposta da pedagogia da presença, na prática, fazer com que esses profissionais compreendam a educação de forma multidimensional e a importância da sua presença para ajudar a mediar na ocorrência de conflitos”, explica Rossana Cavalcanti, pedagoga e técnica do Neve.

Caminhada pela Paz

Aos poucos, as atividades desenvolvidas pelo Núcleo vêm surtindo efeitos positivos dentro do ambiente escolar. A partir das palestras sobre bullying e cybercullying, alunos da Escola Municipal de Tempo Integral Dom Bosco, em Jardim São Paulo, bairro situado na região sudoeste do Recife, decidiram realizar um projeto de combate ao bullying durante todo o ano de 2016. No segundo semestre, promoveram a “Caminhada Escolas Sem Bullying Já!” a fim de alertar os moradores da comunidade do entorno da escola sobre o problema e a relação disso com os alunos.

Caminhada dos estudantes buscou conscientizar moradores de Jardim São Paulo sobre bullying | FOTO: Rossana Cavalcanti/Arquivo Pessoal

A experiência de conscientização proposta pelos alunos ganhou o primeiro lugar na Feira de Conhecimentos da Rede Municipal de Ensino do Recife e foi selecionada para ser apresentada, no mesmo ano, em São Paulo, na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace). O trabalho dos alunos culminou com a criação do chamado “Estatuto do Bullying”, com base nas histórias de jovens que relatavam sofrer problemas semelhantes e em todo o trabalho desenvolvido pelos estudantes ao longo do ano. Uma nova caminhada está prevista para ocorrer no segundo semestre de 2017.

Primeiro coordenador do Neve, George Pereira atua hoje como gestor da Escola Municipal Professor Nilo Pereira, que fica em Casa Amarela, Zona Norte da capital pernambucana. A unidade, que já contou com palestras do Neve, desenvolve suas próprias atividades de rodas de conversa e debates, inspirada na ideia de enfrentamento e prevenção contra violência. A partir de um trabalho de reflexão conjunta com os estudantes sobre os problemas vividos por eles tanto na escola, quanto em casa, e acerca do papel do jovem no protagonismo das mudanças, a escola busca integrar a família e a comunidade nesse processo.

“Trazemos à cena dos debates assuntos diários vividos pelos estudantes, buscando compreender o ambiente em que vivem e levando em conta as diferenças que existem dentro do nosso ambiente escolar. A intenção é promover a autoestima e a reflexão sobre os limites de cada um e as consequências de um possível ato violento. Saber, por exemplo, o que significa destruir uma cadeira ou um quadro na sala e o efeito disso para a vida dele e de todo o colégio no andamento das aulas, fazendo com que os jovens reflitam sobre suas atitudes e sejam protagonistas da mudança”, argumenta George.

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